Conheça a história de Santo Estêvão, o Protomártir do cristianismo, seu testemunho de fé e o impacto teológico de sua morte.
Santo Estêvão ocupa um lugar central na história do cristianismo como o primeiro mártir da fé. Sua vida e testemunho são relatados detalhadamente nos capítulos 6 e 7 do livro dos Atos dos Apóstolos, onde ele é apresentado como um homem “cheio de graça e poder” (At 6,8). Sua coragem, fé inabalável e capacidade de perdoar até mesmo aqueles que o apedrejaram tornam sua história não apenas inspiradora, mas também um ponto de reflexão teológica sobre o papel do testemunho cristão em meio à perseguição.
A Contextualização Histórica
Estêvão viveu no início do cristianismo, em um momento de transição crucial em que a mensagem de Jesus começava a se espalhar além das fronteiras de Jerusalém. Ele era um dos sete diáconos escolhidos pelos apóstolos para servir à comunidade, especialmente os mais necessitados (At 6,1-6). Sua missão, no entanto, ia além da assistência material; ele também pregava e realizava sinais entre o povo.
O ambiente em que Estêvão viveu era marcado por tensões religiosas e políticas. A mensagem cristã, que afirmava Jesus como o Messias, confrontava diretamente às autoridades religiosas judaicas e desafiava os costumes tradicionais. Estêvão se tornou um alvo por sua ousadia ao proclamar que Jesus era o cumprimento da Lei e dos profetas, o que provocou acusações de blasfêmia e ameaça à ordem estabelecida.
O Discurso no Sinédrio
Levado ao Sinédrio sob acusações forjadas de blasfêmia contra Moisés e o Templo, Estêvão pronunciou um discurso profundamente teológico e histórico, no qual resumia a história da salvação desde Abraão até Jesus. Ele acusou os líderes religiosos de “cerviz dura” (At 7,51), comparando-os aos seus antepassados que resistiram aos profetas. Essa acusação direta inflamou os ânimos, culminando em sua condenação à morte.
O discurso de Estêvão é um marco teológico no Novo Testamento. Ele destaca a universalidade da salvação e a centralidade de Cristo como cumprimento da Lei e dos profetas. Segundo Dunn (2019), Estêvão introduziu um novo entendimento do Templo, sugerindo que Deus não estava restrito a um lugar físico, mas habitava onde estivesse o seu povo.
A Morte de Estêvão: O Primeiro Mártir
Estêvão foi levado para fora da cidade, onde foi apedrejado — um método de execução reservado para os considerados culpados de blasfêmia. Durante o apedrejamento, ele pronunciou duas frases que ecoam as palavras de Jesus na cruz: “Senhor Jesus, recebe o meu espírito” (At 7,59) e “Senhor, não lhes impute este pecado” (At 7,60). Sua capacidade de perdoar, mesmo em meio à brutalidade de sua morte, reflete uma profunda conformidade com Cristo.
A presença de Saulo (mais tarde conhecido como São Paulo) nesse evento é significativa. Saulo testemunhou a morte de Estêvão e, inicialmente, aprovou sua execução. No entanto, a semente do martírio de Estêvão parece ter sido plantada no coração de Saulo, que mais tarde se tornaria um dos maiores apóstolos do cristianismo.
A Teologia do Martírio
O martírio de Estêvão não foi apenas um evento histórico, mas também um testemunho teológico. Ele exemplifica o que significa ser uma “testemunha” (do grego martyr), alguém disposto a dar a vida pela fé. Estêvão é frequentemente chamado de “protomártir”, ou seja, o primeiro mártir do cristianismo, e seu sacrifício tornou-se um modelo para inúmeros cristãos que enfrentaram perseguições ao longo dos séculos.
Segundo Faggioli (2021), o martírio de Estêvão introduz uma nova dimensão à fé cristã: a aceitação da morte como um testemunho de fidelidade a Cristo e como uma participação no próprio sofrimento redentor de Jesus. Essa perspectiva encontra eco em muitos escritos patrísticos, como os de Santo Agostinho, que considerava os mártires como sementes da Igreja.
A Relevância de Estêvão na Igreja Contemporânea
O exemplo de Santo Estêvão permanece relevante para os cristãos de hoje, especialmente em contextos de perseguição religiosa. Sua vida nos desafia a refletir sobre nossa disposição de viver e defender a fé em situações adversas. Além disso, sua postura de perdão e oração por seus algozes inspira atitudes de reconciliação em um mundo marcado por divisões.
A memória de Santo Estêvão é celebrada em 26 de dezembro, logo após o Natal, como um lembrete de que o seguimento de Cristo implica compromisso, sacrifício e, às vezes, sofrimento. É um convite a olhar para além das dificuldades terrenas, mantendo os olhos fixos na glória de Deus, assim como Estêvão fez.
Referências Bibliográficas
- Dunn, J. D. G. (2019). The Acts of the Apostles. Grand Rapids: Eerdmans.
- Faggioli, M. (2021). Christian Martyrdom in the Early Church: Theological Perspectives. New York: Paulist Press.
- Brown, R. E. (1997). An Introduction to the New Testament. New Haven: Yale University Press.