Descubra a história de São Paulo Miki e dos 26 mártires de Nagasaki, um testemunho de fé e coragem que marcou o cristianismo no Japão.
A história do cristianismo no Japão é marcada por momentos de intensa evangelização e perseguição, culminando no martírio de São Paulo Miki e seus 25 companheiros em 1597. Esse episódio não foi apenas um exemplo de coragem e fé, mas também um símbolo poderoso do encontro entre duas culturas: o Japão feudal e o cristianismo ocidental. Ao longo do texto, exploraremos a vida de São Paulo Miki, as circunstâncias de seu martírio, o significado histórico desse acontecimento e sua repercussão ao longo dos séculos.
A chegada do cristianismo no Japão e o papel de São Francisco Xavier
O cristianismo chegou ao Japão em 1549 pelas mãos de São Francisco Xavier, um dos fundadores da Companhia de Jesus. A missão de Xavier deu início a uma nova era religiosa no país, conquistando centenas de convertidos, especialmente entre as classes mais humildes. Entre os primeiros a serem evangelizados estava a família de São Paulo Miki, o que despertou nele uma vocação profunda para a vida religiosa.
São Paulo Miki, nascido em uma família de samurais convertidos ao cristianismo, ingressou na Companhia de Jesus e dedicou sua vida à pregação do Evangelho. Apesar de nunca ter sido ordenado sacerdote por falta de um bispo local, tornou-se um evangelizador incansável, promovendo o diálogo com o budismo e percorrendo diversas regiões do Japão para levar a mensagem cristã.
O contexto histórico: a perseguição sob o shogunato de Hideyoshi
O Japão do final do século XVI vivia um período de instabilidade política e cultural. O shogun Toyotomi Hideyoshi, que inicialmente havia tolerado a presença cristã, mudou sua postura diante das disputas entre ordens missionárias e das suspeitas de ingerência estrangeira nos assuntos internos do país. Em 1596, ele ordenou uma severa repressão contra os cristãos, resultando na prisão de Paulo Miki, seis franciscanos, outros jesuítas e vários leigos, incluindo duas crianças.
O martírio no Monte Tateyama
No dia 5 de fevereiro de 1597, os 26 prisioneiros foram conduzidos ao Monte Tateyama, em Nagasaki, onde foram crucificados e mortos. Durante o caminho para o martírio, Paulo Miki permaneceu sereno, pregando a mensagem de Cristo e perdoando seus algozes. Segundo relatos, suas últimas palavras foram um testemunho de amor e fé:
“Declaro que sou japonês e membro da Companhia de Jesus. Não há outro caminho para a salvação a não ser aquele seguido pelos cristãos. Perdoem meus algozes e rezem por eles.”
Esse testemunho impressionou muitos dos presentes, reforçando o impacto espiritual desse sacrifício coletivo.
Os 26 mártires: quem eram eles?
Os 26 mártires de Nagasaki eram um grupo diversificado, composto por missionários, catequistas e neófitos. Abaixo, destacamos seus nomes e funções:
- Religiosos da Companhia de Jesus: João de Goto Soan, Tiago Kisai e um jesuíta desconhecido.
- Franciscanos: Pedro Baptista Blásquez, Martinho da Ascensão Aguirre, Francisco Blanco, Filipe de Jesus de las Casas, Gonçalo Garcia e Francisco de São Miguel de la Parilla.
- Leigos catequistas: Leão Karasuma, Pedro Sukejiro, Cosme Takeya, Paulo Ibaraki, Tomé Dangi e Paulo Suzuki.
- Neófitos: Luís Ibaraki (12 anos), António, Miguel Kozaki e seu filho Tomé, Boaventura, Gabriel, João Kinuya, Matias, Francisco de Meako, Joaquim Sakakibara e Francisco Adaucto.
Cada um deles compartilhou a mesma sentença e a mesma cruz, testemunhando a fé até o último momento.
Canonização e impacto na Igreja
Em 1627, o Papa Urbano VIII beatificou São Paulo Miki e seus companheiros. Quatro décadas mais tarde, em 1862, o Papa Pio IX os canonizou, tornando-os os primeiros santos do Japão. Esse evento teve repercussão internacional e inspirou futuros missionários, como São Daniel Comboni, que encontrou no relato do martírio uma motivação para sua missão na África.
Memória e legado: o museu e a catedral de Ōura
O legado dos mártires de Nagasaki é mantido vivo por meio de museus, igrejas e tradições locais. Em Nagasaki, o Museu dos Mártires apresenta uma vasta coleção de artefatos históricos, incluindo o livro de Luís Fróis, que documenta o martírio de 1597, além de cartas de São Francisco Xavier. A Catedral de Ōura, construída em homenagem aos mártires, é hoje um dos patrimônios históricos mais importantes do Japão.
Reflexão de Bento XVI sobre os mártires
Em 1991, o então cardeal Joseph Ratzinger, mais tarde Papa Bento XVI, comparou o martírio dos cristãos japoneses com o dos primeiros cristãos perseguidos pelo Império Romano. Em sua homilia, afirmou:
“Os relatos sobre o martírio dos primeiros cristãos japoneses assemelham-se de maneira surpreendente ao que sabemos sobre as testemunhas da fé da Igreja primitiva. Não havia neles a menor sombra de fanatismo, apenas uma enorme certeza e uma serena alegria.”
Conclusão: um exemplo eterno de fé e coragem
A história de São Paulo Miki e seus companheiros mártires é um convite à reflexão sobre a fidelidade ao Evangelho e o poder do perdão. Seu testemunho atravessa os séculos, inspirando gerações a seguir os passos de Cristo, mesmo em meio a dificuldades extremas. Como padroeiros do Japão, eles continuam a interceder por aqueles que buscam força e perseverança na fé.