Origens humildes e fé inabalável
Francisco Marto nasceu em 11 de junho de 1908 e sua irmã Jacinta Marto em 5 de março de 1910, ambos naturais de Aljustrel, uma aldeia em Fátima, Portugal. Eles eram os mais novos dos sete filhos de Manuel Pedro Marto e Olímpia de Jesus, uma família humilde, mas profundamente religiosa. A rápida realização do batismo, com menos de duas semanas após o nascimento de cada um, evidencia a importância da fé católica na vida da família, refletindo o costume da época de proteger a alma da criança o mais cedo possível através do sacramento.
Infância simples e dedicada ao trabalho
Desde cedo, as crianças contribuíam para o sustento familiar. Aos oito anos, Francisco já pastoreava o rebanho de ovelhas da família ao lado de sua irmã Jacinta, então com seis anos, e de sua prima Lúcia dos Santos. Esse cotidiano simples e próximo à natureza moldou o caráter contemplativo de Francisco e o coração compassivo de Jacinta, preparando-os, sem que soubessem, para a missão que lhes seria confiada.
As aparições que transformaram suas vidas
O Anjo da Paz e a Virgem Maria
Em 1916, antes das aparições da Virgem Maria, as crianças testemunharam três visitas de um ser celestial que se apresentou como o Anjo da Paz. Essa figura os exortou à oração e ao sacrifício, preparando-os espiritualmente para os eventos do ano seguinte. Em 1917, entre maio e outubro, os irmãos viram a Santíssima Virgem Maria em seis ocasiões na Cova da Iria. Durante essas aparições, Nossa Senhora pediu que rezassem o Rosário diariamente, fizessem penitência pelos pecados da humanidade e intercedessem pela conversão dos pecadores, com a promessa de que, assim, a paz seria restaurada no mundo.
O compromisso imediato com a fé
O encontro de 13 de maio de 1917 foi especialmente marcante. Diante da pergunta da Virgem: “Quereis oferecer-vos a Deus?”, Francisco, Jacinta e Lúcia responderam com prontidão: “Sim, queremos”. Esse momento representou uma entrega definitiva à vontade divina, alterando completamente a trajetória de suas vidas. A partir de então, ambos adotaram uma vida de oração constante e aceitação dos sofrimentos como forma de reparação pelas ofensas cometidas contra Deus.
Personalidade e espiritualidade de cada um
Jacinta Marto: compaixão e sacrifício
Jacinta destacou-se pelo amor profundo aos pecadores e pelo desejo de salvá-los através da oração e do sacrifício. Mesmo sendo apenas uma criança, demonstrava uma maturidade espiritual impressionante, oferecendo com alegria os sofrimentos que enfrentou durante sua breve vida. Sensível ao sofrimento alheio, frequentemente rezava pelo Santo Padre e pelas almas do purgatório, movida pela compaixão e pelo desejo de aliviar a dor dos outros.
Francisco Marto: contemplação e consolação
Francisco, por sua vez, tinha uma natureza mais introspectiva e contemplativa. Seu maior desejo era consolar Deus, especialmente por meio da adoração ao Santíssimo Sacramento. Chamava Jesus presente na Eucaristia de “Jesus escondido” e passava horas em silêncio diante do sacrário, oferecendo suas orações como forma de reparar os pecados da humanidade. Sua serenidade diante dos sofrimentos e sua capacidade de encontrar alegria na oração são características que marcaram sua espiritualidade.
O sacrifício final: a entrega da vida pela fé
No final de 1918, ambos contraíram a gripe espanhola, uma pandemia que assolou o mundo no período pós-Primeira Guerra Mundial. Apesar dos intensos sofrimentos físicos, mantiveram-se fiéis à missão que acreditavam ter recebido. Jacinta, após uma dolorosa internação em Lisboa, faleceu sozinha no Hospital D. Estefânia em 20 de fevereiro de 1920, oferecendo seu último suspiro como um ato de amor a Deus. Francisco, por sua vez, faleceu em 4 de abril de 1919, após receber o viático, em paz com sua missão cumprida.
Os restos mortais dos irmãos foram posteriormente trasladados para a Basílica de Nossa Senhora do Rosário, no Santuário de Fátima, onde até hoje são venerados por peregrinos de todo o mundo.
Reconhecimento da santidade: do martírio espiritual à canonização
Beatificação por São João Paulo II
O caminho para a canonização de Francisco e Jacinta Marto começou oficialmente em 1946, com a abertura do processo diocesano. Em 13 de maio de 2000, durante uma visita ao Santuário de Fátima, o Papa São João Paulo II os declarou beatos, reconhecendo o testemunho de fé e sacrifício que deram ao mundo.
Canonização pelo Papa Francisco
Dezessete anos depois, em 13 de maio de 2017, no centenário das aparições, o Papa Francisco canonizou os irmãos Marto, tornando-os os primeiros santos não-mártires da história da Igreja a serem reconhecidos por sua infância vivida em santidade.
O milagre que confirmou a santidade
O milagre que levou à canonização ocorreu no Brasil, em 2013. Um menino de cinco anos chamado Lucas caiu de uma altura de mais de seis metros, sofrendo um traumatismo craniano grave com perda de tecido cerebral. Após os médicos considerarem improvável sua recuperação, a família rezou pedindo a intercessão dos beatos Francisco e Jacinta. Em poucos dias, Lucas se recuperou de forma inexplicável para a ciência, sem sequelas, sendo esse fato reconhecido pela Congregação para as Causas dos Santos como um milagre autêntico.
A relevância dos irmãos Marto para o mundo atual
O testemunho de Francisco e Jacinta Marto continua inspirando milhões de pessoas em todo o mundo. Suas vidas são um exemplo de como a santidade não depende da idade, mas da disposição do coração em responder ao chamado de Deus. A simplicidade com que abraçaram o sofrimento em favor dos outros revela uma compreensão profunda do amor cristão, que encontra sentido no dom de si mesmo.
O Santuário de Fátima, construído no local das aparições, tornou-se um dos maiores centros de peregrinação do mundo, atraindo pessoas de diferentes culturas e religiões em busca de esperança, consolo e renovação espiritual. A mensagem deixada pelas crianças de Fátima – oração, penitência e conversão – permanece atual em um mundo marcado por conflitos e desafios morais.
Conclusão: o legado eterno dos pequenos pastores
Francisco e Jacinta Marto deixaram um legado espiritual que transcende o tempo e o espaço. Mesmo em sua breve existência, mostraram que é possível viver uma fé autêntica e transformadora, sendo testemunhas do amor de Deus em meio às dificuldades da vida. Seus nomes, agora inscritos no cânone dos santos, são um sinal de esperança para todos aqueles que buscam viver segundo os ensinamentos de Cristo, lembrando-nos de que, como eles, somos chamados à santidade em nosso cotidiano.
Referências bibliográficas
- DE MARCHI, João. Era uma Senhora mais brilhante que o Sol. Editora Paulinas, 1952.
- KOLBERT, Manuel. Fátima: O Milagre do Sol e as Profecias do Século XX. Edições Loyola, 2017.
- MORALES, Luis. Os Pastorinhos de Fátima: Vida e Mensagem. Editora Santuário, 2010.
- SANTA SÉ. Homilia do Papa Francisco na Canonização dos Santos Francisco e Jacinta Marto. Disponível em: www.vatican.va. Acesso em: 20 fev. 2025.