Santo do Dia

São Galdino: fidelidade, caridade e coragem episcopal

A figura de São Galdino della Sala, arcebispo de Milão no século XII, continua a ecoar na história da Igreja como um símbolo de fidelidade e coragem pastoral. Nascido em 1096, em Milão, no coração de uma Europa em transformação, Galdino viveu num contexto de tensões políticas e religiosas que exigiam dos líderes eclesiásticos não apenas , mas também firmeza de caráter e clareza doutrinal. Sua vida, marcada por uma rápida ascensão e um fim dramático, ainda hoje inspira aqueles que veem no serviço à caridade e na defesa da ortodoxia pilares da missão cristã.

Uma época de conflitos eclesiásticos

Para entender a relevância de São Galdino, é necessário compreender o cenário eclesiológico e político de sua época. O século XII foi um período de fortes disputas entre o papado e o império, num momento em que se delineava com mais nitidez a separação entre autoridade espiritual e temporal. A investidura dos bispos, a autoridade sobre territórios eclesiásticos e o papel dos imperadores no governo da Igreja eram temas intensamente debatidos.

Galdino foi nomeado arcebispo de Milão em 1166, em plena controvérsia entre o Papa Alexandre III e o imperador Frederico Barbarossa, que apoiava o antipapa Vítor IV. A cidade de Milão, por sua fidelidade ao papa legítimo, sofreu duramente nas mãos do exército imperial: foi arrasada em 1162, e muitos de seus clérigos e cidadãos foram exilados ou assassinados. Foi nesse contexto de provação que Galdino emergiu como uma liderança firme e profundamente pastoral.

De arquidiácono a arcebispo: uma missão assumida com coragem

Antes de se tornar arcebispo, Galdino já servia como arquidiácono da catedral milanesa, função na qual demonstrou grande zelo pastoral e capacidade administrativa. Sua escolha para suceder o arcebispo Oberto, num momento tão delicado, revela a confiança que o Papa Alexandre III depositava nele. Uma confiança que não seria traída.

Galdino foi consagrado arcebispo de Sens, na França, onde o papa se encontrava exilado. De lá, foi enviado de volta a Milão com a dupla missão de restaurar a vida eclesial e resistir às investidas do império. A fidelidade de Galdino à Sé Apostólica foi uma das marcas centrais de sua vida episcopal, e não raro ele é lembrado por sua intransigência contra os cismáticos e hereges, particularmente os arianos, ainda ativos na região da Lombardia.

A caridade como testemunho evangélico

No entanto, limitar a figura de Galdino à defesa institucional da Igreja seria reduzir injustamente a amplitude de seu ministério. Ele também se destacou, com grande vigor, na prática da caridade. Não apenas exortava os fiéis a cuidarem dos pobres, mas dava exemplo concreto, distribuindo pão e oferecendo consolo espiritual aos mais necessitados.

Tornaram-se célebres suas visitas às prisões, onde pagava dívidas dos encarcerados por pobreza. Esse gesto lhe valeu o apelido carinhoso de “o pão de São Galdino”, expressão que designava não apenas o alimento material, mas também a presença reconfortante do bispo que levava, junto com o pão, a Palavra de Deus e a oração.

São Galdino compreendia, à maneira dos Padres da Igreja e em consonância com a tradição viva do Evangelho, que o serviço aos pobres é serviço ao próprio Cristo. Como afirmava São João Crisóstomo: “Não honres Cristo com sedas no altar e o deixes nu fora da igreja.”

Pregador inflamado, pastor incansável

Além da ação caritativa, Galdino foi também um pregador ardoroso. Suas homilias tocavam não apenas os corações dos humildes, mas também incomodavam os poderosos. Denunciava com ousadia os abusos do clero, os desvios doutrinais e as injustiças sociais, deixando clara sua fidelidade à ortodoxia católica e à missão profética da Igreja.

A morte de Galdino é reveladora de sua entrega total. No dia 18 de abril de 1176, enquanto pregava com fervor contra os hereges e os inimigos da fé, no púlpito da Catedral de Milão, caiu subitamente e morreu diante de um povo emocionado. Morreu como viveu: anunciando o Evangelho com coragem e paixão.

Legado e canonização

A fama de santidade de Galdino espalhou-se rapidamente. Ainda no século XII, já era cultuado pelo povo milanês, e sua canonização foi confirmada pelo Papa Alexandre III, o mesmo que o consagrou arcebispo. A Igreja celebra sua memória litúrgica em 18 de abril, data de sua morte e símbolo de sua entrada definitiva na glória do Senhor.

Seu legado permanece como exemplo de um episcopado profundamente enraizado no Evangelho, sensível à dor dos pobres, fiel ao magistério da Igreja e corajoso diante das perseguições. Em tempos de relativismo e de pressões externas sobre a fé cristã, São Galdino é um modelo de unidade entre doutrina e ação, entre contemplação e compromisso social.

São Galdino hoje

Nos dias atuais, a figura de São Galdino pode ser lida à luz dos ensinamentos do Concílio Vaticano II, que reforçam a vocação pastoral dos bispos como “sinal e instrumento da caridade de Cristo”. Galdino foi isso para Milão: um verdadeiro sinal da presença de Cristo bom pastor em tempos de provação. Sua memória é especialmente relevante para uma Igreja que busca testemunhar a fé de forma coerente, compassiva e profética.

Na perspectiva do Papa Francisco, que nos recorda constantemente da “Igreja em saída”, Galdino nos ensina que o bispo não é um administrador de estruturas, mas um servidor da Palavra e dos pobres. Sua vida é um apelo contínuo à santidade através da ação concreta.

Oração a São Galdino

“Ó Deus, que concedestes inumeráveis graças ao vosso servo São Galdino, fazendo-o firme instrumento de vossa caridade e fidelidade à santa doutrina, permita-me, a mim também, ser mais fiel a vós e à Igreja, enchendo meu coração de amor para com os pobres e necessitados. Por Nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.

São Galdino, rogai por nós!”

Referências bibliográficas

  • Cantarella, Paolo. La Chiesa Ambrosiana nel Medioevo. Milano: Jaca Book, 2005.
  • Duffy, Eamon. Saints and Sinners: A History of the Popes. New Haven: Yale University Press, 2015.
  • Congar, Yves. A Igreja: De Santo Agostinho ao Concílio Vaticano II. São Paulo: Loyola, 2004.
  • Faggioli, Massimo. True Reform: Liturgy and Ecclesiology in Sacrosanctum Concilium. Collegeville: Liturgical Press, 2012.

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